A coisa que mais me surpreendeu aqui foi a falta de espaço para falar de si, das angústias, dos medos, assim como das conquistas e das maneiras de driblar pensamentos que consomem o cérebro de boa parte dos usuários dos serviços de saúde mental. Foi estranho chegar em um serviço onde não há muito espaço para falar de sofrimento.
Essa é a forma deles trabalharem. Até aqui, nos quatro centros de saúde mental que tive a oportunidade de acompanhar, esse espaço simplesmente não existe. O psicólogo, ao meu ver, acaba ficando sem uma ação muito definida: não são feitas conversas privadas entre usuário e psicólogo, muito menos com a família do usuário, que pouco participa do processo.
O encontro com o psiquiatra dura minutos e é feita rapidamente, pois, como no Brasil, a correria nos centros é grande. Segundo os usuários a conversa é somente sobre a medicação. Mais uma vez, não há tempo para falar de si.
Na verdade, penso que não há interesse em entrar nesse assunto, pois falar de sofrimento é como abrir a porta de um quartinho sujo, antigo e cheio de "tranqueiras". Deve-se bagunçar tudo, limpar coisa por coisa, para depois dar início a arrumação. É cansativo. Exige tempo, atenção, dedicação e uma energia a ser dada ao próximo que não é fácil.Cerati, Gorizia 1968, Ospedale psichiatrico
No centro em que estou, participo de um grupo diário e, neste espaço, quando algum dos usuários tenta falar de si e de seus sofrimentos, a psicóloga, também coordenadora do grupo, imediatamente intervém e diz que aquele não é espaço para falar de sofrimento. É difícil ver e lidar com isso sem poder intervir. Principalmente porque os usuários constantemente dizem sentir falto desse espaço.
A dinâmica daqui, até onde percebi, é conseguir que as pessoas estejam inseridas socialmente. Que tenham casa e emprego. Feito isso, está tudo certo. Funciona desse modo. As pessoas são assistidas e realmente participam dos diversos circuitos sociais. Isso, talvez, compense um pouco essa falta para alguns.
Para os que sentem necessidade de uma atenção e de um espaço para trabalhar tudo o que passa em sua mente, resta pagar por uma terapia ou psicoterapia, o que está fora do circuito da saúde pública. Aqui, a opção mais barata de algum desses serviços custa 80 euros e, com esse preço, nem todos podem pagar e muito acabam ficando sem esse que, para mim, é um dos espaços importantes nos cuidados da saúde mental.
Dessa forma, Trieste se faz diferente do Brasil. Tenho dito que muitas coisas daqui se contrapõem às do Brasil, e é daí que se agrega muito aprendizado desse estágio.
A dinâmica daqui, até onde percebi, é conseguir que as pessoas estejam inseridas socialmente. Que tenham casa e emprego. Feito isso, está tudo certo. Funciona desse modo. As pessoas são assistidas e realmente participam dos diversos circuitos sociais. Isso, talvez, compense um pouco essa falta para alguns.
Para os que sentem necessidade de uma atenção e de um espaço para trabalhar tudo o que passa em sua mente, resta pagar por uma terapia ou psicoterapia, o que está fora do circuito da saúde pública. Aqui, a opção mais barata de algum desses serviços custa 80 euros e, com esse preço, nem todos podem pagar e muito acabam ficando sem esse que, para mim, é um dos espaços importantes nos cuidados da saúde mental.
Dessa forma, Trieste se faz diferente do Brasil. Tenho dito que muitas coisas daqui se contrapõem às do Brasil, e é daí que se agrega muito aprendizado desse estágio.
Cerati, Gorizia 1968, Ospedale psichiatrico
Aline, agora, teoricamente, ficará mais fácil comentar no seu blog!
ResponderExcluirLinee.. eu comento mas nao apareceeee..Nath
ResponderExcluirQuando eu conversava com outras meninas que foram para Trieste, percebia que a saúde mental em Trieste era bem diferente da saúde mental aqui no Brasil. O trabalho clínico nos serviços de saúde mental brasileiros são intensos e valorizados. Desta forma há grupos de terapia comunitária, terapia individual em alguns casos, terapia familiar em outros, etc... Como o saúde mental italiana é referência para o Brasil achei que os serviços daí seguissem a mesma lógica, mas percebi, lendo os seus relatos e conversando com as outras meninas, que são bem diferentes! Na Itália, valoriza-se, como você mesma disse, a inserção social do paciente, a possibilidade de ele exercer sua cidadania, pressuposto principal da reabilitação psicossocial, o que faz com que a rede de serviços de saúde funcione com grande eficiência. No Brasil, o trabalho em rede, bem como em equipe multiprofissional ainda é um grande desafio. Acho que os serviços de sáude mental italianos e brasileiros tem muito a trocar e aprender um com o outro! Mas entrando em contato com outras experiências em saúde mental, percebo que apesar de muitos desafios a serem enfrentados, o Brasil avançou muito nesta área! Fico feliz!
ResponderExcluirEu também concordo com vocês!!
ResponderExcluirComo a Juliana França disse, eu acho que a gente arrasa aqui no Brasil, temos muuuito mais dificuldades sociais que eles, temos que combater a miséria em níveis que Trieste nem se quer sonha. A inserção social nossa é muito mais em baixo o ponto a se discutir.
Mas voltando a sua pergunta no título deste post Aline. Para mim a opção dentro de um Centro de Saúde Mental, é sempre falar do que esta se sentindo, é sempre dar uma escuta para as pessoas que estão buscando ajuda no espaço. A atenta escuta, mostrando apenas um interesse para ouvir o que para o outro faz sentido, por si só pode ser muito transformador, e para ambos os lados, e muita vezes não apenas para quem busca ajuda ali, afinal que ser humano gosta de se sentir ignorado?!
A escuta sincera, estar presente na relação, é o que todo ser humano busca na relação com o outro principalmente quando se esta adoecido psiquicamente.
Aline!!!
ResponderExcluirParabéns pelo blog!!!É fascinante ler seus relatos, e não tem como não fazer esse paralelo com o atendimento aqui do Brasil.Toda essa vivência que está sendo e é muito enriquecedora.
Nos serve para darmos conta do quão importante e válido está sendo o trabalho da saúde mental no nosso país.
Como as meninas disseram, lidamos com muito mais dificuldades que eles e o trabalho está sendo muito bem feito.